Direto ao ponto:
- O que é luta antimanicomial?
- Holocausto brasileiro: O Hospital de Barbacena
- Qual a importância do combate aos manicômios no Brasil?
No dia 18/05 comemoramos no Brasil o Dia Nacional da Luta Antimanicomial, mas você sabe o que isso significa?
A data simboliza a busca pela reforma psiquiátrica no Brasil, é um símbolo de luta pelos direitos das pessoas com transtornos mentais. Falaremos sobre a reforma no território brasileiro mais à frente.
Por enquanto, vamos conhecer o médico psiquiatra Franco Besaglia e a marca por ele deixada no sistema de saúde mental.
Besaglia nasceu em Veneza na década de 20. Foi diretor do Hospital Psiquiátrico de Gorizia por 60 anos e durante esse período testemunhou todo tipo de abuso no tratamento dos pacientes hospitalizados.
Diante dos absurdos presenciados, o psiquiatra se juntou a outros colegas para buscar mudanças e melhorias no cuidado com os enfermos. Ao movimento organizado por Dr.Franco deu-se o nome de Psiquiatria Democrática, desse passo importante surgia a luta antimanicomial.
Por conviver por tantos anos no ambiente psiquiátrico, Besaglia notou que o modelo de psiquiatria atuante na época não conseguia tratar o paciente de modo a proporcionar-lhe qualidade de vida.
Ao contrário, o isolamento em manicômios, muitas vezes, só piorava a situação do portador do transtorno.
Diante de tantas barbaridades, o Dr. Franco Besaglia se opôs a compactuar com a medicina que desconsiderava o paciente como um sujeito de direitos. Por isso, em 1968, publica “A Instituição Negada”, trabalho onde expõe as práticas do Hospital de Gorizia.
Graças aos esforços do médico italiano, a reformulação do tratamento psiquiátrico foi posta em ação, prova disso é o reconhecimento dado pela OMS (Organização Mundial de Saúde) ao Hospital de Trieste.
Dirigido por Dr. Franco, o hospital em questão virou referência na reformulação do tratamento psiquiátrico.
Hospital Colônia de Barbacena e a Luta Antimanicomial
O trabalho do psiquiatra italiano também reverberou aqui no Brasil. A Lei da Reforma Psiquiátrica Italiana, aprovada em 1978, serviu de base para a implementação da reformulação do Sistema Psiquiátrico no Brasil.
Já não era sem tempo, isso porque, em termos de saúde mental, nosso país viveu o que a jornalista Daniela Arbex classificou como holocausto brasileiro.
Fundado no início do século XX, o Hospital Colônia de Barbacena se manteve em atividade por mais de 90 anos.
O lugar era procurado por famílias e pessoas influentes para abrigar os “desajustados sociais”.
Por isso, o hospital acabou recebendo todo tipo de pessoas:
- prostitutas;
- alcoólatras,
- presos políticos;
- mulheres grávidas e solteiras;
- homossexuais;
- simples desafetos…
As pessoas encaminhadas para o “manicômio” eram transportadas em um vagão de trem, popularmente conhecido como “trem de doido”, elas não sabiam, mas a maioria só sairia de lá sem vida.
O hospital era dividido em pavilhões e começou a funcionar com capacidade para 200 pessoas, contudo, na década de 60, cinco mil pacientes residiam lá.
O tratamento despendido aos pacientes era tão desumano que ao visitar o lugar Franco Besaglia o classificou como “campo de concentração nazista.”
Essa denominação não era um exagero do psiquiatra, os indesejados pela sociedade eram submetidos aos “tratamentos” mais sanguinários, incluindo:
- terapia de choque;
- torturas físicas e psicológicas;
- estupros
Além de serem obrigados a
- trabalhar exaustivamente;
- dormir sobre folhas;
- beber água de esgoto
As condições sub-humanas nas quais viviam levou inúmeros pacientes a óbito.
Diante de todo o exposto, conseguimos compreender a necessidade e importância do dia nacional da luta antimanicomial.
O objetivo dessa luta é trazer mais dignidade aos doentes além de evitar assassinatos em massa como ocorreu em Barbacena.
A luta antimanicomial no Brasil: objetivos e desafios
A década de 70 foi cercada de movimentos que denunciam as negligências cometidas em hospitais psiquiátricos, funcionários da saúde de todas as esferas aderiram a movimentos que buscavam uma tratamento mais humanitário para os pacientes.
Familiares, médicos, enfermeiros, psicólogos e psiquiatras se reuniram em 18 de maio de 1987 com o objetivo de organizar um planejamento para a reforma de nosso sistema psiquiátrico.
A importância do encontro não foi deixada de lado, por isso, até hoje, o dia 18/05 é conhecido como dia nacional da luta antimanicomial.
Os objetivos da luta ainda não foram totalmente alcançados, contudo, devemos destacar alguns avanços:
- conscientização da população em relação aos doentes mentais: isto porque a maioria os via como um risco;
- reeducação para combater o estigma;
- a liberdade e inserção do paciente na sociedade;
- respeito à cidadania daquele que é portador do transtorno;
- o paciente tem total direito à escolha junto a seus familiares;
- substituição do tratamento em hospitais por tratamentos comunitários.
Sem contar a implementação do CAPS (Centro de Ação Psicossocial) que como serviço público dispõe de tratamentos intensivos, semi-intensivos e não intensivos.
Destacamos um de seus grandes objetivos: inserir o portador de transtornos mentais na sociedade.
Em casos onde há a necessidade de internação, o próprio CAPS encaminha o paciente para leitos de hospitais de saúde mental que oferecem internação a curto prazo. Essa ação é uma tentativa de evitar internações longas em asilos.
O CAPS conta com terapias, rodas de conversa, oficinas artísticas além dos tratamentos coletivos e individuais.
A palavra de ordem, portanto, é o tratamento mais humanizado.
Pelo direito à vida: Lei Paulo Delgado
Promulgada nos anos 2000, a lei Paulo Delgado garante ao paciente o direito a procedimentos menos invasivos.
De acordo com essa lei, pessoas com transtornos também têm direito de saber mais sobre suas condições e possíveis tratamentos, além de estarem protegidos em relação ao abuso e exploração.
Fora o exposto o paciente não pode mais ser internado sem seu consentimento ou de seus responsáveis. Em caso de urgência, as internações só ocorrerão mediante laudo médico.
A Lei Paulo Delgado surge como uma tentativa de tirar o portador de transtornos mentais do porão da sociedade é uma forma de tratamento mais humanitária e justa.
Todas as leis criadas para o combate aos manicômios surgiram graças ao grande objetivo da luta antimanicomial: dar voz aos pacientes!
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