A pressão para que encontre seu propósito de vida

Faz um bom tempo já que se fala muito em encontrar o propósito de vida, a missão para a qual cada um veio a este mundo.

Uma busca rápida do tema no Google mostra 1.950.000.000 de resultados em apenas 0,52 segundos. Mas porque se fala tanto nisso? Provavelmente porque acreditamos que cada ser humano nasceu para cumprir um papel que lhe foi destinado. Ou porque virou moda.

Afinal, por que estamos aqui? Qual nosso propósito de vida?

Pode ser que há 200 mil anos os homens já olhassem para o universo e, mesmo sem ter consciência, perguntavam-se sobre a vida, ainda que não verbalizassem. Ou não.

A verdade é que, desde que surgiu, a filosofia tem se dedicado a inquirir quem somos, porque estamos aqui, porque agimos como agimos. Há um propósito?

“Ser ou não ser, eis a questão” disse Hamlet no monólogo escrito por William Shakespeare.

Séculos depois ainda não temos respostas às grandes questões da humanidade. Ter um propósito na vida é uma delas. E descobrir qual é virou uma tarefa: responda a 10 perguntas e terá a grande resposta que precisa! Faça o teste e saberá!

Não há dúvidas de que todos estamos em busca de uma razão, de um motivo, de uma missão que nos diferencie como seres humanos, inspirados por pessoas especiais que dedicaram – ou dedicam – suas vidas a causas nobres, em várias áreas, do conhecimento à beneficência ou à luta pela paz.

Faz parte do crescimento querer mudar o mundo. Aí, um dia a gente cresce e descobre que o mundo é muito grande e somos pequenos demais; e simplesmente deixamos para lá.

E talvez seja o “deixar para lá” que tem criado essa pressão tão intensa para que cada um descubra, e defina, seu propósito de vida.

A questão é: será que é tão fácil assim? Será que basta seguir um roteiro by the book para ter a resposta? Será que se trata apenas de um evento, um treinamento, uma mentoria? Teríamos nós, como as empresas, que escrever nossa missão, nossa visão, nossos valores para que realizemos nosso propósito?

“A maior empresa do mundo é a minha vida”

Quem escreveu a frase acima foi ninguém menos que o poeta Fernando Pessoa que tinha como propósito, com certeza, viver a vida, como diz neste poema:

“Não vieste à terra para perguntar/Se Deus, vida ou morte existem ou não. Pega a ferramenta para trabalhar/Pondo na tarefa cada pulsação.
Ferramenta tens, não procures em vão – saúde, fé em ti, arte eficiente, capacidade, poder de expressão, coração sensível e força da mente.”

O que queremos dizer é que, sim, estamos em busca de um propósito de vida. Mas que talvez, e apenas talvez, tenhamos que viver a vida sem necessariamente defini-lo para continuar nossa caminhada.

Pode ser que nossa caminhada seja justamente o propósito de vida, ao colocar na “tarefa cada pulsação”.
Quando está envolvido em algo de todo o coração, com certeza dá o seu melhor, aprende, aperfeiçoa-se, colabora, inclui no que faz as pessoas que estão à sua volta, muda o mundo do qual faz parte, ainda que seja pequeno.

Não seria esse um propósito?

Ou como quando faz uma viagem. O objetivo é chegar ao destino, mas é no trajeto que as coisas acontecem ao aproveitar cada minuto, observar, aprender, maravilhar-se, fazer fotos, filmar, conhecer pessoas, falar a língua, provar a comida. Você se transforma.

“A vida é o que fazemos dela. As viagens são os viajantes. O que vemos não é o que vemos, senão o que somos.”

Mais uma frase do poeta Fernando Pessoa, que nasceu em 1888 e morreu em 1935. Teria ele definido seu propósito de vida para criar tão grandiosa obra?

Ou seu propósito nasceu de sua obra, de como viveu, das pessoas que passaram por ele, do que fez ou deixou de fazer, de quem amou ou deixou de amar, do que aprendeu e de como se transformou ao longo de seus 53 anos?

É fácil saber o que se quer da vida?

Tenho minhas dúvidas se todos sabemos exatamente o que queremos da vida. Podemos ter uma ideia, baseados nos que nos faz felizes: aí então criamos metas, objetivos, desafios, propostas…

E ao voltarmos nossa energia e atenção para conquistá-los vamos nos aprimorando, aprendendo, mudando, transformando não só o nosso mundo, mas tudo à nossa volta.

Se tivéssemos absoluta certeza do que “queremos da vida” em todos os detalhes, não teríamos espaço para a mudança no meio do caminho, para a criatividade, para novas conquistas e desafios.

 

Seríamos limitados pela definição?

Saber o que se quer da vida não parece propósito. O pressuposto para tal certeza seria o de nos conhecermos completamente, e este é um exercício que exige tempo, disciplina e dedicação: é um caminho que não tem fim, o do Autoconhecimento.

De novo talvez, e apenas talvez, sejamos nós mesmos o nosso propósito de vida.

Ou não teríamos o segundo mandamento “Amarás o teu próximo como a ti mesmo” que traz uma mensagem grandiosa: ame-se, aprenda sobre si, cresça, aprenda sobre o mundo, aprimore-se, seja cada vez melhor para que possa dar o melhor para o outro – amá-lo, respeitá-lo, ajudá-lo; atender cada uma de suas necessidades, ser um instrumento para que ele também seja feliz e completo.

A partir daí, sim, pouco a pouco vamos entendendo e percebendo os propósitos que nos trouxeram para cá e, com certeza, viveremos nossa missão de vida com uma visão holística.

Sim, ter um propósito de vida é extremamente importante. Apenas não é tão simples defini-lo como se quer fazer acreditar. Ouvir o coração e a mente é o melhor caminho.

“Viva a tua vida. Não sejas vivido por ela.” Fernando Pessoa